27/10/2008

A face oculta da Coca-Cola


Imagina que vivo em um povoado rural. Neste povoado tenho vizinhos que se dedicam à agricultura, à criação de gado e à transformação de matérias-primas. Eu trabalho na minha própria casa e num quartinho tenho ferramentas e material para fazer molduras para fotografias. Imagina que um dos meus vizinhos é carpinteiro. Esse vizinho carpinteiro tem uma esposa e três filhos; dois varões e uma mulher. Este senhor tem como ritual espancar diariamente com raiva sua família, com quem descarrega a ira que lhe provoca a frustração de seu pouco frutífero trabalho. Imagina que eu vejo como diariamente se sucede a pancadaria na casa do vizinho carpinteiro, mas na gana de que meu negócio prospere, compro a madeira dele. Imagina que comprá-la em outro lugar me supõe um custo adicional e tenho mais rentabilidade na venda das minhas molduras se compro a madeira deste carpinteiro, que maltrata diariamente os membros de sua própria família. Imagina que tu és vizinho meu e queres comprar uma moldura para a foto familiar que tiraste com teus primos que vieram do estrangeiro. Imagina que dia a dia vês o carpinteiro golpear seus filhos e sua mulher. Imagina que dia a dia vês como sorrio e converso com o carpinteiro quando compro sua madeira. Imagina que eu me ofereço a te vender a moldura que andas buscando. Qual és tua resposta?


A isto chamamos consumo consciente ou responsável. “Eu me nego a pagar por isto, quando sei que tua falta de escrúpulos faz com que tu adquira madeira de um carpinteiro que maltrata sua própria família diante de teus olhos”. Pese tudo, com esta marca se amanhece dia a dia em nosso planeta.

Em 1996, o trabalhador da Coca-Cola e sindicalista Isidro Segundo Gil foi assassinado enquanto negociava melhorias nas condições dos empregados dessa multinacional. Se denunciou que, como em outros 10 casos deste tipo e uns 200 seqüestros, ameaças e torturas têm sido levadas a cabo pela empresa através de grupos paramilitares. (1), (2), (3), (4), (5).


Segundo a cientista, escritora e filósofa Vandana Shiva, “a fabricação de um litro de Coca-Cola contamina 10 litros de água”. Enquanto um bilhão de pessoas não têm acesso à água potável (6), a Coca-Cola emprega quantidades enormes de água onde se instala. Em Plachimada (Índia), a multinacional se viu obrigada a fechar pelas pressões da comunidade, culminadas com a ordem de fechamento que o estado de Kerala emitiu, devido aos altíssimos índices de contaminação que provocava esta engarrafadora (7).


Também sabemos que a ONG estadunidense Human Rights Watch denunciou que a Coca-Cola adquire açúcar mediante empresas de El Salvador que empregam crianças, menores de idade (8). Casos de trabalho infantil como este também têm sido documentados no Paquistão. O coletivo Kaos en la Red (kaosenlared.net) cita que “nos Estados Unidos [a Coca-Cola] foi sancionada nos últimos tempos ao menos em 10 ocasiões pelo Órgão de Segurança e Saúde do Trabalho (OSHA) por condições insalubres e graves escapes químicos”. Também menciona o Kaos que “o mais terrível é a ocultação dos danos sobre a saúde que causa a bebida Coca-Cola em si mesma. A Coca-Cola é uma bebida que além de não conter nenhum nutriente, contém substâncias que danificam nossa saúde. Seu conteúdo de açúcar, variável segundo o rótulo entre 10% e 30% do produto, gera obesidade e diabetes. Nos refrigerantes sem açúcar ele é substituído por Aspartame, que tem demonstrado ser cancerígeno. O açúcar, combinado com o ácido fosfórico (outro de seus ingredientes ativos), altera o equilíbrio do cálcio e do fósforo do organismo provocando deterioração rovocando deterioraçentes ativosl e responslherdo ossos, desnutrição, anemia e redução dos glóbulos vermelhos. Este mesmo excesso produz deficiência de vitamina B e B12. O ácido fosfórico produz mais sede e é responsável pela adição que gera a Coca-Cola”.


Se a capacidade de raciocínio humana for minimamente consciente e crítica, isto bastaria para sentir repulsa cada vez que vemos a etiqueta deste refrigerante. Mas existem mais razões que podem fazer despertar a mais profunda das letargias. Esta empresa que distribui suas mais de 400 marcas em 232 países vendendo 1,3 bilhões de produtos diários (9), é também solidária. Financiou com 610 mil dólares a campanha eleitoral de George Bush. Também colabora com paraísos fiscais como as Ilhas Caiman ou Bahrein, onde guarda grande parte de seu dinheiro com alta precaução sem prestar contas dele.


Pode-se interpretar como fruto da casualidade que o ex-presidente do México, Vicente Fox Quesada, escalara gradualmente a hierarquia desta multinacional de 1965 a 1979. Mas quando outros sinistros personagens como o grande amigo de Bush e Felipe González, suspeito de apoiar a intentona golpista na Venezuela em 2002, o magnata venezuelano Gustavo Cisneros, proprietário da Coca-Cola neste país; quando Adolfo Calero, agente da CIA que atuou contra o governo sandinista na Nicarágua, foi diretor da Coca-Cola em Manágua durante a ditadura militar de Somoza; e quando isto continua numa longa lista de personagens obscuros; dá no mínimo uma certa desconfiança. Somemos que esta transnacional foi multada por discriminação racial (10) e um larguíssimo etcétera que convidamos a conferir (11), podendo completar a investigação com outros documentos de maior envergadura (12).


Se trata de uma questão ética, independente das consequências que uma decisão possa ter ou não no desenrolar dos acontecimentos. Da mesma maneira que não compro a madeira do desumano carpinteiro, não pago com meu dinheiro os produtos da desumana multinacional.


Rubén Jiménez "Doramas"


O texto original em espanhol está neste blog das Ilhas Canárias:

http://canarias-socialista.blogspot.com/2008/09/imagina-que-coca-cola-no-es-buena.html


(1) http://www.profesionalespcm.org/_php/MuestraArticulo2.php?id=3362
(2) http://www.prensarural.org/cocacola.htm
(3) http://kanalb.org/text.php?clipId=117
(4) http://www.nodo50.org/derechosparatodos/Areas/AreaCOLOM-46.htm
(5) http://coordinadora.popular.googlepages.com/dieza%C3%B1osdelasesinatodeisidrosegundogilgil
(6) http://www.elmundo.es/elmundo/2006/11/07/solidaridad/1162900271.html
(7) http://www.indiaresource.org/news/2006/2010.html
(8) http://www.elmundo.es/elmundo/2004/06/10/solidaridad/1086868786.html
(9) http://www.alasbarricadas.org/noticias/?q=node/251
(10) http://www.larepublica.com.uy/sociedad/28552-condenan-a-coca-cola-por-discriminacion-racial
(11) http://simon-bolivar-org.blogspot.com/2006/04/porque-amo-la-vida-no-consumo-coca.html
(12) http://www.rebelion.org/docs/10924.pdf

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